quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

In " A CARTA "

Capitulo XX - "A Carta"
 
Agora, findo o Natal, tenho de preparar a minha subida à serra, que infelizmente, não a vi coberta por um manto branco de neve no dia de Natal. Certamente haverá outras oportunidades para ver o meu lugar, revestido de brancura cristalina e observar os flocos esfarrapados caindo sobre a terra e as casas, dando-lhes um aspeto de uma beleza, linda de se ver, neste inverno que já vai em contagem decrescente.
Espero com uma certa ansiedade pelo fim de fevereiro, para começar a ver as flores a desabrocharem, como um anúncio de primavera. Até lá, redescobrirei toda a compostura do agreste das terras de Castro, onde me fixei, para levar a minha vida pelo melhor.
Começo a ter saudades da minha modesta casinha, onde lá, se concretiza toda a minha nova vida de aprendiz de escritor. Digo aprendiz, porque tenho noção que estou a muitas léguas de grandes escritores, e custa-me, por vezes, identificar-me como escritor. Na vila as pessoas conhecem-me como o escritor, é verdade que tenho obra publicada, mas isso só não chega…
Tenho alguns projetos em mente, alguns já organizados para pôr em prática. Penso que serão seis meses, até ao verão, de intenso trabalho, contatos com editoras, presidente da Câmara, Casa da cultura, trabalhos fotográficos, domésticos e muitas outras coisas mais...
Sabes amiga! Tenho um prazer enorme de sonhar acordado, e por vezes, ver os meus sonhos realizados, fruto do meu trabalho, e de amigos que acreditam nas minhas capacidades criativas. É sempre bom receber os amigos que me estão acompanhando nestes últimos anos, novos amigos, novas realidades, que vou triando para ficar o melhor das relações sociais. Normalmente, costumo dar sempre o benefício da dúvida às novas amizades, e só depois de uma análise profunda, é que parto para outra. Por mais mal que me façam, fica sempre algo de bom numa relação de amizade desfeita, e assim, gosto de ficar pelas boas vibrações que me deram. O mal não me interessa, já lá vai, e fica esquecido num canto adormecido do cérebro.

Quito Arantes

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

"A CARTA"


Capitulo XIX

 

A chuva vai caindo, incessantemente, não é “abril águas mil”, é o inverno ditando o seu conteúdo. Aqui na cidade, enquanto passo as festas de natal, tenho pena que chova muito, pois sempre podia tentar trazer o meu pai ao café; tarefa bastante difícil ou quase impossível. Mas também é bom que chova, faz parte do ciclo da natureza neste país, adormecido aos enquanto da sua natureza. Por vezes não há tempo nem dinheiro, para dar uma escapadela, bem! Mas há tempo para ir ao futebol mesmo que chova, ou a um concerto do cantor em moda. Mas isso são escolhas individuais que toda a gente tem a liberdade de escolha. Quem viva em algum tédio e tendo posses para o mudar, bem podia olhar mais em seu redor, olhar o verde, ver as pequenas coisas que passam despercebidas aos olhos atarefados dos citadinos, e virando-se para a mãe natura, poderiam muito bem descobrir novos valores de existências belas, e modos de vida que nos faz pensar para melhor.
Quero que este tempo na cidade passe depressa, mesmo que arranque uma saudade da minha família. Só não ando à chuva porque certamente ficaria doente, gripado, mas por vezes, gosto de a sentir escorrer pela face, mesmo que fria ou gélida da serra. Os campos serão regados para que a primavera crie boas sementeiras, e eu ansioso de ver a explosão de cores primaveris. Será sempre como uma primeira vez que assisto. Quero ir ao abrunheiro em flor e retirar umas folhas para fazer a minha infusão de chá, que me aconselharam para uma enfermidade que me vem rodeando no dia-a-dia. Vamos ver se resulta…
Amiga! Não me recordo da última vez que me visitaste, porque até foi há muito tempo, mas recordo-me dos teus concelhos para as minhas plantas, vi a delicadeza com que lhes puseste as mãos. Ver crescer dia-a-dia, as plantas e flores, é lindo, tento falar com elas, e por vezes elas sabem dizer se estão com cede.
Certamente quando chegar a casa, levarei com uma nevada, daquelas que deixa o meu carro preso à calçada portuguesa, mas nada será dramático, é o clima que escolhi para viver e o qual me sinto melhor.
 
In "A Carta"
excerto
a editar
Quito Arantes

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

"Na Rota de Le Patriache"


Ricardo sabia que lhe esperava um novo mundo que ainda não tinha vivido, mesmo obtendo informação sobre a comunidade, em Portugal, iria ser uma nova experiência. Chegado ao centro de reabilitação, foi recebido por uma jovem que lhe falou em português, e lhe deu as boas vindas. Paula, a portuguesa que já lá estava há um ano, a primeira pergunta que lhe dirigiu, deixou-o apreensivo:
- És negativo? Ele respondeu: - Como assim?
- Se não estás infetado com o VIH?
- Ah! Não, não tenho o vírus…
- Chamas-te Ricardo, não é?
- Sim, Ricardo, prazer em conhecer-te.
-Sabes, normalmente aqui há dois tipos de residentes, os negativos, sem o vírus, e os positivos que contraíram o vírus. Mas é só isso, convivemos todos juntos, sem problemas.
- Tu vens limpo, ou a ressacar?
- Venho limpo há dois meses, e vim sozinho de Portugal, de autocarro.
Paula irradiou um sorriso e disse:
- Estranho, normalmente, ninguém vem limpo, e nunca vêm sozinhos, sempre acompanhados por familiares.
- Eu vim de livre vontade, penso que será bom para mim.
- Ainda bem que pensas assim. Agora vais ser acompanhado duas semanas por dois residentes, que te darão todo o apoio que necessitares.
O centro era todo ele a um estilo barroco, bem conservado. Tinha um largo pátio com jardim. Ricardo foi conhecendo os residentes que eram de várias nacionalidades, com predominância de espanhóis e italianos. O responsável máximo do centro era um espanhol de nome José, positivo, de poucas falas, mas simpático.
Depois de se inteirar do grupo, começaram a distribuir tarefas. Ao Ricardo e os dois acompanhantes, coube-lhes os animais. Do outro da estrada que passava junto ao centro ficava um grande campo, pertencente ao centro, onde se situava o campo de futebol e os animais. Patos, galinhas, porcos, etc…
Todos os residentes gostavam de ir para os animais, pois não era trabalho duro e estavam mais à vontade, fora dos olhos dos responsáveis do centro. Limitavam-se a dar de comer e a fumar uns cigarros.
Naquela semana, os acompanhantes eram Joseph, italiano, de Génova, e Pietro de Nápoles. Os dois eram seropositivos, mas que não transpareciam as suas enfermidades. Inicialmente, Ricardo tinha uma certa dificuldade em os entender, embora eles falassem castelhano, que era a língua oficial do centro. Praticamente toda a organização era controlada por espanhóis. Eram os mais numerosos.
 
In " Na Rota de Le Patriache "
A editar
(Excerto)
Quito Arantes

domingo, 15 de dezembro de 2013

" A CARTA "


E aqui estou, mais uma vez, acordado pela madrugada de cabeça fresca de um sono “mais ou menos bem passado”. Mas o importante é, que estarei sempre presente nesta carta que te escrevo, das quatro estações, que por vezes nos vai transformando em seres melhores.
 Tenho que ter sempre uma música de fundo, acompanhando o meu escrevinhar, para assim as palavras saírem com maior fluidez. Em toda esta carta já te falei de mim, de pessoas próximas, da natureza em constante mutação, mas quero-te falar mais destas estações do ano que transformam a terra a e a paisagem. Poderei ser, eu, um homem diferente, para melhor? Espero bem que sim, mas nunca o conseguirei sozinho, terei sempre que ouvir ensinamentos de pessoas que por gentileza se vão aproximando de mim e contam episódios de suas vidas sem nada lhes ser pedido. Memorizo o cerne das questões, vivo histórias que me contam, como se fosse um singular elemento delas, e vou aprendendo devagarinho, que vidas não devem ser comparadas. Tenho um certo apreço por gente que se aproxima de mim, que tem boas vibrações com a minha presença e aí vou escutando com simpatia. Na maior parte das vezes, sentimentos sofridos, onde pairam acontecimentos vividos por pessoas que longos caminhos percorreram para chegarem à minha conversa. Não sei se é da viagem que vou fazendo na minha vida, que me faz sentir um homem melhor. Houve tempos, tempo longínquos que nada destas coisas me diziam respeito, passava ao lado de histórias de vida, que certamente seriam fascinantes, mas hoje, não perco uma boa histórias, venha ela de onde vier, mas, sempre que venha por bem, não vou muito em histórias de vinganças, não faz o meu género.
Nestes dias de festas natalícias, terei oportunidade para tentar viver de forma consciente a cidade materna, sem preconceito, tentando abster-me dos agitamentos citadinos, com se fosse uma simples mosca se sobrevoa de aroma em aroma. Quero deixar-me ir pela solidez dos acontecimentos desta terra que me viu crescer de forma um pouco ortodoxa. Mas hoje homem maduro tento ser consensual por onde passo.
Ontem, eu e meu pai olhávamos pela janela da saleta. Observávamos as árvores do jardim público que fica logo em frente, e meu pai dizia: - Ainda há pouco tempo não se via nada para lá das árvores, hoje estão despidas de folhas.
Notei nele uma certa tristeza desta “natureza morta”. Sem deixar pousar a tristeza nele, respondi-lhe:- Deixe lá Pai, é o inverno, daqui a dois meses as árvores voltam a arrebentar e bonitas flores das ameixoeiras bravas, trarão alegria ao jardim, anunciando a primavera. Vai ver que daqui a nada já vai ver tudo verde…
 
In " A Carta "
excerto
em curso
Quito Arantes

sábado, 14 de dezembro de 2013

" A CARTA "


Capitulo XVIII
 
Depois de carregado o carro até ao tejadilho, despedi-me dos meus vizinhos, e com vontade de ver meus pais, fiz-me à estrada. Ameaçava chuva, mas felizmente, foi uma viagem tranquila. Deixar a serra não é fácil, é muito mais fácil deixar a cidade e subir para os meus encantos, onde a natureza espera sempre por mim, recebendo-me de braços abertos.
O reencontro com os meus pais, é sempre feito em alegria, principalmente quando os encontros bem de saúde.
Ontem, foi dia de tratar de assuntos profissionais e sentimentais. Apesar de levar uma multa de estacionamento, nunca é demais quando é para visitar a minha amiga do coração que está hospitalizada. Fui encontrá-la bem, e com um sorriso meigo quando deu com os olhos em mim. Foi uma visita de uma hora, onde falamos um pouco de tudo. Irá passar o Natal com a família, já com o bicho morto, e alegria de viver. Teremos os nossos encontros, sempre que os nossos corações assim o ditem. Vim feliz, sei que está bem e que talvez amanhã volte para sua casa.
Custou-me um pouco voltar ao frenesim das cidades, tive que me concentrar mais do que o costume para levar findo tudo direitinho. As multidões mexem comigo, já não me habituo ao encruzilhar das pessoas pelas ruas das cidades. Gosto de sentir o caminho livre pela minha frente, sem grandes obstáculos.
Nestes dias que estarei na casa dos meus pais, farei o máximo possível companhia ao meu “velhinho”, que por vontade própria, não sai de casa já há muito tempo. Sinto-me um privilegiado por ainda ter família, quero dizer, pais. Continuamos a ser um grande suporte para ambos, mas não quero falar de futuro, quero viver um dia após o outro.
Aqui na cidade o inverno é mais ameno, ainda se pode considerar fim de outono, as folhas castanhas ainda continuam a cair agora com mais ferocidade. Rastos de folhagens acumulam-se pelas bermas da estrada e passeios, muito trabalho para os homens camarários que tem por função limpar todas estas folhas caídas e mortas de um ano de vida.
 
Excerto
In " A Carta "
em curso
Quito Arantes
 

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

ATÉ SEMPRE!


Levar a vida com arte, não era para qualquer um. Mas Adolfo, que trabalhara toda uma vida como trabalhador indiferenciado, engolindo todo o tipo de “sapos”, aproveitara, conscientemente, a oportunidade que a vida lhe ofereceu para se tornar naquilo que sempre ansiava
Abdicou do supérfluo, do conformismo social, de uma vida estável, para lutar pelos seus objetivos. A cidade já não lhe dizia grande coisa, os carros a redopiarem nas estradas superlotadas, a poluição sonora, aquele frenesim que tanto motivava as pessoas, já nada lhe diziam. Queria vir à cidade quando fosse estritamente necessário, e só isso. Queria estar na sua aldeia adotiva, sentir o vento, a chuva, a neve a cair em brancos flocos que cobriam a natureza de uma brancura fresca pelas manhãs de inverno, onde do seu escritório, observava pela janela do seu contentamento.
Aquela vida solitária, em que ele não assumia como tal, era interrompida por visitas de novos amigos, que passavam por lá, para saber dele. Ficava feliz pelas visitas, tecia longas conversas, e às vezes apresentava cozinhados que eram uma delícia para seus amigos. Podia até ser problemático, mas era amigo do seu amigo. Tentava compreender os anseios de quem lhe estavam próximo.
Adolfo vivia como se o dia não tivesse amanhã, como se o presente fosse infinito. Acordava de manhã, muitas vezes ainda o sol não raiava, e fazia com que o seu dia fosse uma vivência imprescindível. Gostava de dar passeios pela aldeia, redescobrir novas coisas que do nada surgiam para seu contentamento. Ninguém lhe complicava a vida naquela nova residência, toda a gente o respeitava por aquilo que era: “ O Escritor “ era assim que era conhecido na aldeia, ou então de um a forma mais sarcástica, um “Pelica”, que era aquela pessoa que vinha de fora da aldeia, novo residente.
 
In " Até Sempre!"
excerto, a editar
Quito Arantes

domingo, 8 de dezembro de 2013

"A CARTA"

Capitulo XVII

 

O Natal aproxima-se a passos largos, e eu penso, como o José Luís Peixoto quando diz: “à mesa seremos sempre cinco”, no meu caso, seremos sempre quatro, o meu pai, a minha mãe, eu, e meu irmão que está na casa dele com a sua família.

Será sempre um regresso às origens, onde enquanto for possível, viverei aqueles dias de festas natalícias, como se de um menino me tratasse. ­Abraçarei meus pais, com a intensidade de sempre, mostrarei que seu filho continua a amá-los tão bem ou melhor.

 Deixarei a serra nas festas natalícias enquanto meus pais forem vivos, e assim “seremos sempre quatro à mesa”, menos o meu irmão que está com a família e os sogros.

Não vou dizer que não sinto saudades deles, porque estaria a mentir com todos os meus dentes. Tenho saudades dos meus sobrinhos, do meu irmão e da minha cunhada, muito embora possa não ser recíproco em relação ao meu irmão, mas isso não tem importância para mim, porque nunca deixarei de amá-lo.

 Será bom voltar a minha casa em janeiro, com todo este frio de inverno, e voltar a ver e conviver com os meus vizinhos. Haverá um tempo que já daqui não irei sair, penso eu, mas como nada é definitivo, à que viver um dia após outro, e senti-lo com intensidade, mesmo que seja para o bem ou para o mal.
 
In "A Carta " Capitulo XVII
em curso
Quito Arantes
 

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

"A CARTA"




Capitulo XVI


 

 

Neste inverno, esperarei que a terra se remova no seu interior, como eu espero remover-me no meu interior, sendo assim, continuamente uma pessoa melhor. Tenho fé, que poderei ser melhor do que sou, que encontrarei forças para melhorar o meu íntimo.
Continuo nestas horas da madrugada, escrevendo-te, até que o outono volte a chegar, assim, terminarei esta carta, tornando como concluído o ciclo das estações. Até lá muita coisa pode acontecer, e por isso, pode haver casos que falarei nas estações que sucedem a este inverno tão característico aqui na serra.
Ontem, quando vinha da Vila, resolvi tirar uma fotografia que me faltava. A imagem vista de sul, do meu Lugar, com o sol alaranjado incidindo sobre o moinho de vento e as primeiras casas, por entre carvalhais despidos de folhas. Era a foto emblemática que me faltava do Lugar onde vivo. Já tinha fotografado o belíssimo forno comunitário, centenário, e também “a poça”, tanques de água, também eles centenários, onde se pode beber água fresca da nascente, dar de beber aos animais, regar campos, e até lavar roupas grossas e finas. A “poça”, também é lugar de reuniões dos meus amigos vizinhos que por vezes, ao sol do inverno se aquecem, e conversam, ou então noutras alturas do ano, quando o tempo aquece, principalmente no verão, as conversas se prolongam até à noite.
Podem falar o que quiserem, mas continuo dizendo que este espaço do Parque Nacional da Peneda-Gerês, é inteiramente “mágico”, faz-me lembrar que nada mais existe no mundo, a não ser, estes maciços granitos lá do alto dos montes, os carvalhais, e vidoeiros, os cursos de água fresca e límpida que deambulam pelos regatos e muros e bermas, e as gentes desta terra…, sim! Essas são muito singulares.
 
In "A Carta" - Inverno
em curso
Quito Arantes