Desde
muito novo fui duro de ouvido, não porque ouvisse mal, mas sim, porque não
queria ouvir o que me diziam ou o que escutava. Assim fui fazendo a minha
personalidade como se um deficiente me tratassem. Coisa que nunca me disseram
abertamente. A adolescência era para ser vivida sem rodeos, não importava
quanto maluco fosse, era para ser vivida com toda a vontade de ser feliz à minha
maneira.
Filho
de várias revoluções dos anos 60, 70, 80, 90 do século XX, atravessei tempos
tempestuosos bem de leve sem que me envolvesse de corpo e alma nelas, pois,
sabia que só podiam ser efémeras e nem tudo de bom poderia acontecer, como
realmente o provir assim o provou.
Quando
era criança, talvez com onze anos, cheguei a casa vindo das aulas do primeiro
ciclo, entrei no quarto dos meus pais e reparei que estavam atentos à
televisão. Era um astronauta americano a descer do vai e vem e a pôr o pé na
superfície lunar. A memória deste acontecimento mundial ficou-me retida até aos
dias de hoje.
Trinta
anos passados deste acontecimento pensei ser um astronauta num centro de
reabilitação, talvez pensasse, loucamente, numa nave preste a deslocar-se para
o espaço. Coisas que podem acontecer ao mais simples dos cidadãos, porque
ninguém está imune a momentos de loucura, em certas fases de suas vidas.
Felizmente estes delírios foram passando com o tempo, e hoje, controlo
perfeitamente os momentos delirantes.
Saber
que algo de diferente em mim se passava, só mais tarde, muito mais tarde, na
idade adulta dei conta de mim. Não, não são vozes esquizofrénicas que vou
ouvindo, são mesmo escutas das conversas dos outros que ouço com o meu ouvido
duro.
Tudo
podia ser delírios meus, mas não, eu estava acordado para a vida, como nunca
estivera e apesar de estar já numa faze física descendente de uma vida feita de
pouco sentido, tinha esperança que ainda ia muito a tempo para ser quem queria
ser.
Ser
especial não é para qualquer um, temos que ser uns irresponsáveis cretinos, e
ao mesmo tempo, uns homens convictos de firmezas que nos levam para a frente de
batalha sem rodeos.
Eu
sei que até no meu corpo escarraram e que me puseram pior que um cão vadio, mas
não vai ser por isso que vou ser uma pessoa pior de sentimentos, talvez, seja
um homem melhor, que suporta a dor infringida com um sentido mais terno ao meu
semelhante. Nunca sei quem tenho realmente pela frente, e toda a gente já
passou por sofrimentos piores ou iguais aos meus, portanto, terei que ser um
bom ouvinte para analisar e aprender melhor, sempre melhor na imensidão da dor.
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Peter Quiet
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